A série série Dark e sua relação com as incertezas

Uma discursão, utilizando a série Dark da NETFLIX como contexto, para discutir o conceito de incerteza.

Frederico César

7/26/20243 min read

A série Dark talvez seja uma excelente oportunidade para refletirmos sobre nossa dificuldade em lidar com o futuro. Para aqueles que não acompanharam os anos de 2019 e 2020, Dark foi uma das séries de maior sucesso da Netflix, especialmente no ano de 2020. Trata-se de uma produção alemã que aborda o tema da viagem no tempo, lembrando que um dos maiores teóricos dessa área foi o físico alemão Albert Einstein. Usando conceitos sofisticados, mas apresentados de forma acessível ao grande público, a série explora viagens entre universos paralelos e o próprio tempo. Alguns desses conceitos nos ajudam a compreender melhor a incerteza. Uma das afirmações que permeia toda a trama é que não possuímos o tempo; é o tempo que nos possui. Além disso, passado, presente e futuro estão interligados por um nó indissociável. Essa ideia é fascinante, pois, segundo ela, o passado é afetado pelo futuro, assim como o futuro afeta o presente, já que todos fazem parte do mesmo contínuo. O que muda é apenas o ponto de vista a partir do qual observamos.

A incerteza está relacionada à nossa ignorância sobre o futuro, à nossa incapacidade de prever ou antecipar o que pode acontecer. O problema é que sempre pensamos, planejamos, julgamos e tomamos decisões antes de agir. No contexto racional, a decisão precede a ação. Ou seja, a ação ocorre em um momento diferente daquele em que a decisão foi tomada. O mundo que visualizamos e para o qual decidimos agir estará, inevitavelmente, no passado quando a ação de fato se concretiza. Isso é extremamente interessante. Quando começamos a decidir, precisamos primeiro perceber os sinais, dados e estímulos presentes, que estão relacionados ao evento sobre o qual iremos agir. Esse evento, por não ter ocorrido ainda, pertence ao futuro, mas os estímulos estão no presente. Após percebê-los, recorremos a um conhecimento que foi adquirido no passado, pois todo conhecimento é construído a partir de experiências vividas, analisadas e sintetizadas. Com esse conhecimento, interpretamos os estímulos e os transformamos em informações, que serão utilizadas para planejar e julgar a ação necessária para transformar uma realidade futura.

Todo planejamento se baseia em uma projeção de futuro que estamos arquitetando. Se essa realidade futura já ocorreu algumas vezes no passado, temos um conhecimento acumulado sobre sua dinâmica, o que facilita nosso planejamento e julgamento. Quanto mais eficientes somos em projetar esse futuro, identificando suas variáveis críticas e prevendo as relações de causa e efeito das possíveis ações, maior será nossa capacidade de influenciá-lo positivamente. Após planejar e avaliar as ações possíveis com base nesse conhecimento do passado, decidimos qual será nossa intervenção. No entanto, há algo curioso: o lapso entre o momento em que decidimos agir e o momento em que a ação ocorre provoca uma mudança na realidade sobre a qual pretendemos interferir. A realidade que planejamos no momento da decisão já não é mais a mesma no instante em que agimos. Esse intervalo pode durar segundos, horas, semanas, meses ou até anos, criando um paradoxo: decidimos com base em um futuro que, ao agirmos, já não existe mais, pois o tempo passou.

E onde está a incerteza nisso tudo? Ela reside na ocorrência de eventos que têm pouca ou nenhuma relação com o passado. Embora toda ação parta de um passado, muitas vezes esse passado não é suficiente para entender a realidade futura em que a ação será realizada. O problema é que esse futuro chegará independentemente da nossa vontade, pois, como afirmado em Dark, o tempo não nos pertence; somos nós que pertencemos ao tempo, e ele continuará a existir, com ou sem nossa intervenção. O ato de não agir e deixar que o tempo avance diante de um evento desconhecido também é uma decisão, e terá suas consequências. Quanto menor nossa capacidade de prever essa realidade futura, identificar suas variáveis críticas e correlacioná-las com eventos passados, maior será nossa ignorância sobre esse futuro e, consequentemente, maior será a incerteza.

A incerteza afeta o presente, que, por sua vez, é influenciado pelo passado. Ela está sempre ancorada em um futuro que, independentemente da nossa ação, inevitavelmente se revelará para nós.

A grande questão é: quão preparados estaremos para lidar com esse futuro quando ele se tornar o nosso presente?